Uma das razoes, entre muitas, porque nao nos devemos automedicar tem que ver com o facto de ser preciso ter os conhecimentos que permitam fazer um diagnostico completo da doenca e, depois, saber escolher a terapêutica adequada, isto é, que seja capaz de atacar o mal sem provocar desequilíbrios fatais no funcionamento do organismo
do paciente. Precisamos, por isso, de alguém que, pelo menos em teoria, assegure que nos cure da doença e não nos mate com a cura.
Vem isto a propósito da receita que está a ser aplicada para enfrentar a crise da nossa divida publica e do deficit orçamental.
Todos estaremos de acordo que, por razoes múltiplas, umas da nossa responsabilidade, outras da responsabilidade de um sistema selvagem que presidiu, e ainda preside, à governança da economia global, estamos numa situação de grandes dificuldades que tem que ser enfrentada com toda a determinação.
O acordo com a Troika é um instrumento, que, embora gostássemos de ter evitado, estabelece uma receita, que sendo difícil de executar, deixa alguma margem para opções que, internamente, permitam conduzir o comboio do nosso destino, com atenção para evitar despistes, mas sem perder capacidade de nos transportar ou atropelando os passageiros.
Na negociação desse acordo teremos conseguido evitar a receita que foi imposta à Grécia e, posteriormente, beneficiamos ainda de alterações nos mecanismos de ajuda da UE, que nos baixaram a taxas de juro e nos alargaram os prazos de pagamento.
Assim sendo tudo parecia indicar que poderíamos, sem perda de rigor e determinação no combate ao problema, ajustar a terapia evitando os efeitos secundários da sobredosagem que, tal como na saúde, só se devera aplicar em situação limite.
Ou seja, nao podemos deixar de adoptar as medidas necessárias, mas nao estamos obrigados a ir para alem disso e, muito menos quando isso pode causar efeitos colaterais que podem por em risco o próprio Pais e a sua capacidade para se levantar.
Como dizia Antonio Costa na Quadratura do Círculo, precisamos de cumprir o acordo com a Troika, mas precisamos de tempo. O tempo do acordo é suficiente. Ir mais depressa pode conduzir ao despiste.
No mesmo sentido vai Pacheco Pereira ao referir que "cumprir com zelo o programa da Troika é fundamental. Como ninguém controla com rigor a execução orçamental, admito que nesse zelo se inclua 'ir mais longe do que a troika' para haver folga para os buracos. Mas duplicar as medidas da Troika e aplicá-las no estilo martelo pilão numa espécie de volúpia de impostos, ou pior ainda ... através de cortes estatísticos, ou seja às cegas, tem um efeito destrutivo muito para alem da recessão de dois anos prevista pelos mais optimistas"
E aqui é que bate o ponto. A receita que está a ser adoptada é uma sobredosagem face à terapêutica concertada que, segundo a imprensa de hoje, ultrapassa em 6 mil milhões de euros a poupança prometida.
E esta sobredosagem tornará insuportável a vida dos pobres, que já nao aguentam mais, provocará o empobrecimento das classes medias, potenciará ainda mais a recessão da nossa economia e afectará, seguramente, a capacidade de retoma.
O ambiente que se respira é preocupante e os sinais de depressão colectiva estão aí.
Sabendo que há muita coisa que nao depende de nós e que a Europa tem que ser capaz de encontrar soluções globais e solidarias, nao seria bom parar um pouco para pensar e, como sugere Pacheco Pereira, pedir a ajuda de sociólogos, historiadores, ou apenas gente com algum saber da vida e do Pais?
É que é preciso evitar que, para curar a doença nao se morra da cura.
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