Confesso que estou preocupado com o que tenho ouvido nos últimos dias, a propósito das supostas escutas a Belém. Aquilo que poderia ter sido uma brincadeira de verão, afinal transformou-se numa coisa preocupante Não pelas escutas que, ao que tudo indica, não terão existido, como era, aliás esperado, mas pelas reacções que o assunto provocou, a partir de uma notícia do DN em que foram publicados os e-mail que mostravam os contornos da história.
A essa notícia seguiram-se tomadas de posição que me parecem graves, tendo em conta quem as proferiu. Em primeiro lugar o Director do Público que, de manhã, insinua que o SIS poderia estar a escutar o seu jornal. Disse-o e tal maneira que parecia que tinha provas calras do que afirmava. Sim, um director de um Jornal como o Público, não pode dizer aquelas coisas sem estar bem suportado, ou então seria um irresponsável e isso seria incompatível com o cargo.
Mas à noite do mesmo dia veio dizer que, afinal, não havia indicios de violação do sistema informático do jornal, revelando que o mail para a comunicação social teria saído de um computador do próprio jornal. E a esta mudança de posição, que eu saiba, no momento que escrevo esta nota, não correspondeu um simples pedido de desculpas e ninguém lhe pediu responsabilidades. Mas será normal que um director de jornal possa lançar tamanha suspeita, infundada e que ele prório desmente horas depois, sem que nada aconteça?
Ainda sobre este tema pronunciou-se o Sr. Presidente da República. E fê-lo, a meu ver, de forma inadequada. Pronunciou-se sobre o tema dizendo que não queria pronunciar-se e, ao escolher esta forma, acabou por falar deixando a ideia que algo de grave se passava e que tomaria medidas depois das eleições. A forma como o fez, o tom que adoptou e a ênfase que deu à expressão "segurança", transmitiu uma mensagem que permite interpretações que o Presidente tem fortes suspeitas de que poderá haver escutas sobre Belém. Ora parece-me que um Presidente não pode lançar suspeitas deste tipo sobre matérias tão sensíveis, que têm origem em passagens de informação por parte de um elemento de peso da sua casa civil. Penso, sinceramente, que não o devia ter feito. Coisas com esta gravidade exigem uma intervenção clara e não comentários que podem deixar dúvidas junto dos portugueses, especialmente neste período eleitoral em que o Presidente deve gantir completa neutralidade no processo político.
Mas há outro acontecimento que me deixou muito perplexo. A lider doPSD, ainda antes da correcção do director do Público, resolveu, demagogicamente e de forma populista, cavalgar o tema tentando fundamentar, com ele, a sua tese fantasiosa da asfixia democrática. MFL veio dizer que não admitia que o Director de um Jornal pudesse estar sob escuta. Ora JMF veio horas depois dizer que o jornal não estava sob escuta. MFL precepitou-se e isso não é próprio de quem quer ser Primeiro-Ministro. E precipitou-se sobre um assunto muito sério. Lançou a suspeita sobre um Serviço de Informações da República. Quem actua com tanta leviandade não tem, de facto, condições para governar Portugal.
Mas o PSD revelou completa falta de responsabilidade de novo no dia seguinte. O recém eleito deputado europeu, Paulo Rangel, que se pensa investido de um poder escrutinador do bem e do mal e que se pensa especialista em asfixia democrática, vem insitir no tema, depois de ter já ficado claro que as escutas, quer a Belém, quer ao Público, não passaram de fantasias orientadas para fins específicos. De tal modo é assim que o próprio Provedor do Público não se inibe de responsabilizar a direcção do jornal pela conduta errada que teve neste processo, admitindo que poderemos estar perante uma agenda oculta. Até Marcelo Rebelo de Sousa, um dia depois de ter apoiado MFL em Coimbra, sentiu necessidade de vir dizer que afinal não aconteceu nada e que o Assessor do Presidente da República merece um puxão de orelhas.
Acompanho MRS nesta conclusão. Penso é que um puxão de orelhas é pouco face à gravidade da situação criada e, para ser coerente, MRS deveria recomendar, também, um puxão de orelhas ao director do Público e à lider do PSD e seus principais dirigentes, por entrarem, de forma leviana, nesta história e persistirem nela, mesmo depois dos desmentidos dos próprios envolvidos.
Penso, sinceramente, que os portugueses darão esse puxão de orelhas no dia 27. Na política não vale tudo. E brincar, irresponsavelmente, com coisas sérias, não é próprio de quem quer ser governo.
E isto porque penso que o Provedor do Público poderá ter razão. Parece mesmo haver uma agenda oculta em todo este caso. Não só no Público, mas também por parte do Assessor da Presidência da República e do próprio PSD, ao serviço de uma tentativa de atingir, em matéria tão sensível, o Governo e o seu Primeiro Ministro. Isto parece hoje cada vez mais claro.
E PORQUE É QUE NÃO ACONTECE NADA?
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