A semana que agora termina, vista através do que nos chega pela comunicação social, fica assinalada por um conjunto de acontecimentos que, em minha opinião, são motivo de preocupação:
1. A propósito de uma greve no sector dos transportes, independentemente da opinião que cada um de nós possa ter sobre a sua oportunidade e sobre as suas motivações, ouvimos uma infeliz declaração do Secretário de estado dos Transportes mostrando uma completa ausência de cultura democrática ao deixar transparecer a ideia de que o direito à greve deveria ficar condicionado à agenda do governo. Todos sabemos que todas as greves produzem efeitos negativos e positivos, consoante o lado de que se faz a análise. Não vou discutir, como disse, as motivações e a oportunidade da greve. Isso compete a quem a convoca e sobre as suas decisões tem que prestar contas aos trabalhadores e à sociedade em geral. O que quero aqui afirmar é que um membro do Governo deveria considerar-se, ele sim, condicionado na emissão de juízos de valor e na utilização de argumentos, aparentemente reais, mas que estão carregados de demagogia. Governar em democracia é um pouco mais difícil do que em ditadura. É verdade. Mas quem não tem jeito para isso deve mudar de vida;
2. O Primeiro Ministro anunciou a nomeação de António Borges para assumir a responsabilidade pelo acompanhamento das privatizações e pela reorganização do Sector Empresarial do Estado. Segundo a comunicação social a justificação dada foi que se tratava de alguém que vinha do FMI, e isso seria uma forma de garantir que o acordo com o FMI seria cumprido. Esta nomeação poderia ser mais uma e não merecer qualquer atenção. Nem sequer discuto o ajustamento do perfil do nomeado à missão que lhe está destinada. Acho mesmo que, para quem gosta da politica que este governo se propõe seguir, até tem um perfil para além do que se poderia exigir a um alto dirigente da Administração Pública. E aí é que, na minha opinião, bate o ponto. Sendo a tarefa de que é incumbido tipicamente uma tarefa para Ministro, não estaremos perante a nomeação de um novo Ministro, sem o ser? e que efeitos terá isso no funcionamento do Governo e no exercício das competências dos Ministros responsáveis por essa área tão estratégica?
3. Vasco Graça Moura desafiou e desautorizou o Governo ao decidir que o Acordo Ortográfico não se aplica no CCB. Sou, também, dos que não são grandes apoiantes do Acordo Ortográfico. Aliás não o utilizo e nem sequer me debrucei muito em conhecer, ao pormenor, as suas regras. Vou escrevendo como sempre escrevi, não porque foi assim que a minha professora Serafina e Maria de Lurdes me ensinaram, mas porque não me sinto confortável em escrever fato, quando me quero referir aos factos que aqui hoje motivam este meu post.
A questão não é, portanto, estar em desacordo com Vasco Graça Moura relativamente ao acordo Ortográfico. Até estou próximo das suas posições.
Acontece é que quem tomou a decisão não foi o escritor e poeta Vasco Graça Moura, que tem todo o direito de, nessa qualidade, escrever como muito bem queira. Acontece que foi o Presidente da Fundação CCB que decidiu contrariar uma decisão do Estado Português, invocando que o CCB é uma entidade de direito privado, embora ele tenha sido nomeado pelo Governo, e, ainda mais grave, porque está a anular uma decisão do Governo anterior e não do Governo que o nomeou.
E fez isto em tom desafiante.E essa decisão obrigou o Primeiro Ministro a afirmar no Parlamento que o Acordo está em vigor e é para cumprir.
Espera-se, agora, que o Governo imponha a lei e a autoridade do Estado no CCB ou, caso não o consiga, retire as consequências de tal rebeldia. Demitindo Graça Moura, pois claro.
4. O Primeiro Ministro, ainda no Parlamento, respondeu, de forma seca e desconcertante, a uma pergunta de António José Seguro, dizendo que não o preocupava a demissão da direcção de informação da RDP. Se tivermos em conta que essa demissão vem na sequência de uma crónica critica à RTP, a propósito de um programa da RTP em Angola, estamos conversados. A coisa tem um quê de preocupante.
5. O Primeiro Ministro, com o seu ar de valente, voltou a afirma a sua completa indisponibilidade para encarar de frente o problema do reajustamento das contas e divida públicas. Afirma, sem mais, que não pedirá mais dinheiro nem mais tempo para cumprir os compromissos a que Portugal está obrigado. Não está em causa cumprir. O que está em causa é saber se podermos, junto das instituições internacionais, encontrar outros remédios, que não nos matem com a cura. E isto não é nenhuma reivindicação teimosa da oposição. Não só os Nobel da economia Krugman e Stiglitz, Adolfo Soares, o Presidente Alemão do Parlamento Europeu, mas também a sua companheira Manuela Ferreira Leite, defendem a necessida de alargar os prazos para o ajustamento para que se possa ganhar espaço para incentivar o crescimento da economia.
O Primeiro Ministro insiste na receita da austeridade, a que somará mais austeridade se for necessário.
Não vamos longe assim. E isso preocupa-me.
2 comentários:
Um pequeno reparo ao seu texto, os mitos sobre o acordo ortográfico são muitos, tem todo o direito de não o usar mas ao dizer porque o não faz ficar-lhe-ia melhor usar um exemplo correto. Facto continuará a escrever-se facto, ao contrário do q Vasco Graça Moura (curioso ter sido ele a pôr a circular o mito) escreveu há uns anos numa desonesta crónica. Ontem tinha posto esta "cábula" online, deixo-lha ficar http://twitpic.com/8fbuxj
Obrigado pelo seu reparo Shyznogud.
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